Reincidência

 

Era sempre no mesmo ponto do sonho.

A boca de Dr. Rafael em sua nuca. As mãos dele segurando sua cintura como se ela fosse a única mulher do mundo. Os gemidos abafados pelo vidro da janela do escritório. E o sussurro dele, rouco, urgente, dizendo seu nome como se fosse uma prece profana.

 

— Helena…

Ela acordou ofegante. As coxas trêmulas, os lábios entreabertos, a respiração acelerada. O lençol preso entre os dedos. O corpo todo aceso, pulsando, implorando. Gemera alto — e não era a primeira vez. Vinha acontecendo há dias. Noites inteiras consumidas por lembranças de Dr. Rafael. E manhãs em que acordava com a calcinha úmida, o peito apertado, e o desejo latente demais para ignorar.

Não era saudade.

Era fome.

Desde aquela tarde no décimo andar, nada mais nela foi o mesmo.

Dr. Rafael tinha deixado marcas. Invisíveis, profundas, deliciosamente perigosas.

Preciso vê-lo.

Ela já não conseguia fingir controle. Tentou. Tentou se ocupar com o trabalho, com as audiências, com os prazos. Mas bastava uma brecha, uma pausa no dia, e ele invadia seu pensamento como um raio. A voz dele, o cheiro dele, a forma como a tocava… como se cada pedaço dela fosse único e necessário.

 

Desceu da cama ainda quente de sonho, foi até o closet e parou diante do espelho. Pele nua, marcada por lembranças. Tocou os próprios ombros, como se fossem as mãos dele. O arrepio veio imediato. Aquilo era loucura — mas era uma loucura da qual ela não queria se curar.

 

Ela precisava sentir Dr. Rafael outra vez.

Não só o corpo… ela queria o homem.

O olhar que despia.

A barba roçando no colo.

As mãos fortes segurando suas coxas com sede.

A voz grave dizendo indecências com aquele sotaque mineiro que derretia até sua lógica jurídica.

 

Pegou o celular. Digitou. Apagou. Respirou fundo. Mas os dedos agiam sozinhos.

“Dr. Rafael, eu…”

Não.

“Oi. Hoje cedo eu acordei… lembrando de você.”

Apagou de novo.

Mas antes que o bom senso a impedisse, mandou:

 

“Preciso te ver. Urgente.

Sem argumentos.

Sem defesa.

A ré se declara reincidente do teu toque.”

 

Digitou. Enviou.

Silêncio.

 

Dois minutos depois, a resposta chegou, curta e destruidora:

 

“Meu escritório. Hoje. 19h.

Traga só sua vontade. O resto eu resolvo.”

 

Helena sorriu.

Mordeu o lábio inferior, arrepiada da nuca até os pés.

 

Era isso.

Ela iria.

 

Porque tinha coisas que não se explicam.

Só se sentem.

E Dr. Rafael era isso: um caso que ela jamais conseguiria arquivar.